O cérebro e o processo de
Humanização
“Todas as
possibilidades do mundo no homem estão esperando como a árvore espera em sua semente.”
Sri Aurobindo.
O cérebro em
nível físico é instrumento privilegiado da mente para expressar-se e
desenvolver-se. Assim, desde a Antiguidade, filósofos, artistas e cientistas
formularam teorias e concepções relacionadas ao seu desenvolvimento,
características e importância na vida humana, bem como as relações mente e
corpo. “Mente sã em corpo”. È uma máxima que fundamenta a visão da saúde como
resultado do equilíbrio mente e corpo.
Nos estudos
iniciais do cérebro ele foi dividido em lobos onde se localizariam as funções superiores
do Homem. Assim, a área do lobo temporal esquerdo seria responsável pela
compreensão da linguagem. Acreditava-se que todos os destros e 30% dos canhotos
utilizariam apenas o hemisfério esquerdo no desempenho das funções
lingüísticas.
Após pesquisas
detalhadas em pacientes com déficit de linguagem ou lesão cerebral, os
lingüistas descobriram que as funções da linguagem se espalham por uma área
grande do córtex e regiões subcorticais e parte superior do tálamo. È bastante
provável que a fala, assim como a compreensão da linguagem ativem complexas
redes de diferentes regiões cerebrais e não apenas o hemisfério esquerdo.
O
desenvolvimento das técnicas de imageamento do cérebro permitiu examinar uma
pessoa enquanto executa uma tarefa; investigar o local onde as ações são
registradas e ainda como as áreas cerebrais responsáveis pela linguagem se
relaciona desde a vida pré-natal.
Por exemplo,
para saber onde fica a área da sintaxe (construção de frases); a semântica
(significado das palavras) e a prosódia (melodia do discurso), estudiosos
recorreram à ressonância magnética funcional que registra a atividade dos
neurônios e as alterações de concentração de oxigênio no cérebro. Foi medida a atividade cerebral de
voluntários enquanto ouviam frases corretas e outras que continham palavras com
significado absurdo ou frase com erro sintático ou gramatical. Observaram-se
então as áreas que registravam o significado das palavras em que nas frases incorretas
e frases absurdas havia mudanças na atividade neuronal.
Ao ouvirmos
a língua falada o cérebro desempenha a analise acústico-fonética das palavras
(o que é; parece com que?; qual o significado?; qual a imagem?etc). Depois ele
separa as informações no hemisfério esquerdo, nas partes superficiais do lobo
temporal e as regiões profundas do lobo frontal analisam primeiro as categorias
de palavras (leitura). O sistema de reconhecimento da linguagem assimila a
estrutura sintática e em seguida vêem as informações semânticas em frases (escrita).
No
hemisfério direito é elaborada a informação prosódica sobre a seqüência dos
sons: todo esse processo demanda no máximo 600 milissegundos por palavra e
também foi constatado que as áreas do cérebro amadurecem em ritmos diferentes,
desde a fase pré-natal.
Assim, a
percepção sensitiva precede as demais e a criança ouve desde o terceiro mês de gestação e reage a sons familiares.
Isto ocorre porque as suas vias nervosas
aferentes amadurecem antes de suas vias nervosas eferentes, ou seja, o bebê recebe muito mais informações
do que pode responder.
Desse modo,
embora o bebê não tenha condições de distinguir os princípios lógicos do que
ele ouve ou sente, muito cedo começa a reagir conforme os estímulos sejam ou
não positivos. Com apenas três dias de vida, o bebê pode diferenciar o rosto
humano de outras figuras circundantes, mas não identifica os traços. Porém,
distingue detalhes da fonação de modo surpreendente: a pesquisadora francesa
Ghieslaine, demonstra como os recém-nascidos diferenciam a mudança de uma
consoante em uma série repetida da mesma sílaba, embora não diferenciem a
constante da sílaba de uma única vez sem repetição de uma delas. Também ele se
reconhece na prosódia paterna e sabe diferenciar o idioma em que habitualmente
se lhe falam e se torna capaz de reconhecer suas próprias imagens no espelho.
Progressivamente
ocorre a diversificação de funções, pois que a evolução da espécie acabou por
criar e multiplicar zonas especializadas e que para funcionar de forma
integrada essas áreas dependem da modelagem que lhe seja impressa nos primeiros
anos após o nascimento.
Daí a
importância da Educação Infantil na estimulação sistemática e progressiva nos
chamados “anos decisivos”, ou seja, de 0 a 6 anos.
Se o sistema
nervoso nasce incompleto e o cérebro apresenta uma imensa plasticidade neural,
são reais as possibilidades do desenvolvimento biopsicossocial – o fundamento da
construção progressiva do Ser Humano – concepção corrente em todas as áreas do
conhecimento.
Como estas
áreas se inter-relacionam? Quais as conseqüências dos problemas ou da
estimulação do desenvolvimento do cérebro? Até que ponto se influencia a estimulação
do desenvolvimento físico e mental?
São essas
perguntas que atualmente a Neurociência se faz, com técnicas modernas de imageamento
do cérebro e através dos estudos das lesões e perdas neuronais e suas
conseqüências na fala, na compreensão, no comportamento e na aprendizagem.
Através de
estudos das psicoses, da loucura, de distúrbios apresentados por pacientes nos
hospitais psiquiátricos observou-se que certas áreas não respondiam quando
estimuladas eletricamente – porque se relacionava as dificuldades no
comportamento, na fala, na compreensão, na leitura, nos movimentos, etc.
Então, cada
vez fica mais claro que o cérebro funciona em rede e que os dois hemisférios se
comunicam desde as percepções e ações motoras às sensações internas e externas
e as funções cognitivas (atenção, memória, raciocínio e todas as operações
mentais).
Elas se
integram continuamente nas áreas de interpretação, sejam motoras, perceptivas
ou ideativas e produzem a compreensão do mundo, a aprendizagem de conceitos,
habilidades ou atitudes.
Por outro
lado, as descobertas sobre os neurônios-espelho e neurônios-grade mostram que
este processo se baseia nas percepções viso-auditvo-motoras de tempo e espaço.
Ou seja, a aprendizagem se funda na imitação,
na repetição e na rotina das ações, atitudes, hábitos e
da linguagem ouvida, falada ou lida.
Por isso, a
importância da ação educativa pela imitação, afetividade e a estimulação
visual, auditiva e psicomotora para fortalecer o amadurecimento e integração
das áreas do cérebro. Então, as funções superiores da lógica da matemática e da
linguagem seriam tão importantes nos currículos escolares quanto às atividades
lúdicas e artísticas predominantes no hemisfério direito.
Essa é a
Educação Integral que desde os primeiros anos podem favorecer o amadurecimento
dos neurônios aumentando as sinapses os dendritos e as conexões que se
complexificam quanto mais sejam adequadas e ricas às situações e vivencias psicomotoras
afetivas e sociais.
Daí, a
necessidade da estimulação das áreas do cérebro com atividades integradoras,
envolvendo ritmo, linguagem, música, jogos e todas as formas significativas de
aprendizagem, trabalhando os conhecimentos físicos, lógico-matemática e
sócio-culturais segundo propõe Jean Piaget.
Essa
integração permitirá a criança e ao adolescente a pensar de modo vasto e
complexo desde os anos iniciais de sua vida, ou seja, devemos ensinar-lhes por
relações e não por categorias; por sistemas e não por partes.
È preciso
trabalhar desde cedo os processos mentais necessários a percepção das relações
entre atributos e qualidades memorizadas, compreendidas e expressas, sobretudo
pela linguagem – instrumento essencial da aprendizagem.
È
importante, pois, que o pensamento sistêmico seja desenvolvido no educando e no
educador, para que se criem as condições para as elaborações mentais de que o
cérebro é capaz e cada vez mais ampliá-las no desenvolvimento das 100 trilhões
de conexões estimadas entre os neurônios do cérebro adulto e que espero ser
exploradas. Quanto mais conexões, mais memória, mais aprendizagem, melhor a
organização das idéias e dos pensamentos.
Nesta
perspectiva, a aprendizagem é a criação dos significados – um processo complexo
de relações onde as experiências são preservadas a partir do significado que o
Homem lhes atribui. A experiência que ocorre em nível do “vivido” é simbolizada
e armazenada por meio da linguagem. (Então, os mecanismos básicos da linguagem
são: 1º) o interesse (ou o motivo):
somente se aprende aquilo que se considera útil na sobrevivência física, social
ou psíquica;
(2º) a memória – permite a retenção dos
valores atribuídos ao que é experimentado ou aprendido;
(3ª) generalização e transferência –
permitem interpretar e agir em novas situações com base nos significados e
valores aprendidos e vivenciados.
Focalizando
sua atenção sobre o que sente (o significado), suas relações, causa e
conseqüências, o individuo pode encontrar novos significados, novos símbolos e
novas formas de expressão. Isto é um exercício de metacognição e de autoconsciência
– a razão de ser do processo de humanização e de transformação do mundo.
( Organização de Maria de Lourdes Fioravante)
“Há em todas as coisas
visíveis uma fecundidade invisível. Uma luz tênue, uma humildade anônima, uma plenitude oculta.
Há em todas as coisas
uma inexaurível doçura e pureza, um silêncio que é uma fonte de ação e de
alegria. Surge sem palavras, imensamente
da mente, de dentro...”
Thomas Merton – Aprender a ver. In Ananda n} 28pag.14.
A descoberta do cérebro, a inteligência e memória humana
Desde a
Antiguidade, as ciências sempre buscaram resposta para as questões cruciais da
humanidade:
1º -
Quais as relações entre corpo e mente?
2º -
Quais as relações entre comportamento, emoções e aprendizagem?
3º -
Como estimular as capacidades humanas no individuo?
4º - Quais as
relações entre pensamento e linguagem?
5º - Como desenvolver a inteligência e
memória humana?
Até a década de 70 muitos eram os mitos
sobre a mente humana e a sua capacidade de aprender e modificar o ambiente. Ela
é uma atividade complexa de processos mentais e cerebrais interconexos: isto
era investigado mais por deduções ou por pesquisas em cadáveres ou pessoas com
doenças mentais. Era um mistério o funcionamento do cérebro e as suas relações
com o corpo e a mente. Então, imaginava-se como o cérebro pensava , como
guardava ou não as coisas na memória, de que forma se produzia a linguagem .Não
havia meios de mostrar como isto acontecia.
Assim, até mais de 20 anos,
pesquisadores, médicos e educadores consideravam que o cérebro se desenvolvia
num período determinado de tempo (infância e adolescência) e que não havia
registro de regeneração dos neurônios nem de compensação por lesões ou perdas
do tecido nervoso.
Ora, a mente humana não é uma
“faculdade” isolada ou aprioristica, mas uma atividade complexa caracterizada
por uma estrutura sistêmica de um conjunto dinâmico de componentes psicológicos
( volitivos, cognitivos e afetivos) em regiões e áreas cerebrais interligadas.
Assim, diz Benito Damasceno, no artigo A
Mente Humana- Revista Multiciência UNICAMP – SP : “a atividade mental é uma
reconstrução interna (“ virtual”) de operações externas com as coisas e as
pessoas, mediada por instrumentos e signos, principalmente os da linguagem “.
O cérebro é, pois, uma entidade material
localizada dentro do crânio e a nível físico o instrumento privilegiado da
mente para expressar-se e desenvolver-se. Ele é composto de substâncias
químicas, enzimas e hormônios e seu funcionamento se dá através dos neurônios
que fazem a interligação entre as áreas do cérebro que possibilitam todas as
ações e reações humanas. Constitui-se, então, numa rede complexa de 100 bilhões
de neurônios com cerca de 100 trilhões de conexões que desencadeiam todas as ações humanas sejam físicas,
emocionais, mentais, sociais e espirituais.Por isso, o cérebro do homem è o
maior na escala da evolução e o cérebro
da criança aumenta de volume à medida que amadurecem os neurônio e as conexões
aumentam nas relações com o novo ambiente e a estimulação do cérebro.
Assim, desse modo o desenvolvimento do cérebro ocorre mais rápido
nos primeiros anos de vida da criança e seu desenvolvimento sadio atua
diretamente sobre a sua capacidade
cognitiva que se desenvolve pela internalização e apropriação das ações
internas e externas de acordo com a estrutura gene ética do individuo e da espécie e suas relações com o meio . É o grande mistério que
as neurociências ainda pouco conhece mas suas descobertas são essenciais para o
conhecimento do Ser humano e sobretudo a sua educação – o instrumento
privilegiado da evolução e da aprendizagem. Eis o que o professor deveria
conhecer.
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